Por António
Centeio
Se as
pessoas não são capazes de ter a força suficiente para aguentar a passagem da
tempestade como é que poderão valorizar as mudanças interiores que tantas vezes
são necessárias para o que desejam tenha outro significado?
Foi isto
que sempre faltou a Mariana, fazendo com que a sua vida como os seus sonhos,
quase nunca se concretizassem.
Bem cedo
abriu as portas a toda a espécie de contrariedades que só acontecem a quem não
sabe que a vida, como as ondas do mar, tanto sobe como desce.
Passou a ter como companhia os dissabores do
infortúnio para exclamar constantemente que a
“vida nada de bom” lhe tem dado. O caminho da sua desalinhada e pobre personalidade como do ambiente em que foi
criada, contribuiu para que quase tudo viesse ter com ela.
Quando já
se encontrava à muito no «fundo da vala» foi então que finalmente viu o brilho de uma estrela, que
no Céu, iluminava quem mais parecia um farrapo que um ser humano.
Sentiu no
seu interior que «lá de cima» qualquer
coisa lhe iria acontecer – para o bem ou
para o mal.
Para quem tem como
companheira habitual a aspereza da vida, é difícil acreditar nos sinais que
muitas vezes se escondem por detrás de uma estrela.
A sua voz
interior disse-lhe “o que sentiste era algo que nem todos podem ver ou sentir”. Foi quando se lembrou que
tinha sido uma estrela que levou os reis
magos a caminho de Belém.
A sua alma sorriu enquanto o seu
corpo se arrepiava. Pela primeira vez na sua vida, cheia de mazelas, sentiu e
tinha tido a noção de ouvir algo que até
à data nunca tinha julgado ser possível. A não ser que...“fosse mais uma partida do destino”.
Mas, se até sentiu um arrepio,
porque não acreditar naquilo que desconhecia
ou funcionava? Foi quando se lembrou que antes das tempestades, o “Vento avisa para se recolher”.
Cinquenta
anos. Como companhia, o contrário daquilo que sempre sonhou. Ter uma aranha ou um ratazão como
companhia para ela eram coisas mais que
suficientes para voltar as costas de vergonha a quem de igual julgava ser.
Nas manhãs frias em que até o
Sol parecia nada querer com ela ou de
tão pouco lhe fazer companhia, sentava-se em cima da verdura que lhe servia de
lençol para olhar para o vale que na sua frente convivia de espanto para com a
natureza. Esta combinação era o contraste do
que sentia dentro nas suas
profundezas de ser humano que era, mexendo na sua dor e recordando-lhe as
agruras da vida, as quais, eram as suas melhores companhias. Quando a bola de fogo descia, então a
sua alma falava-lhe para lhe dizer que estava triste e que devia plantar frutos
na terra para que conseguisse mudar as
coisas.
Muitas vezes, quando olhava para a
estrada, que ficava tão distante, mas ao mesmo tempo tão perto, costumava
ver as pessoas vestidas de negro ou de
cinzento acompanhando o carro que no seu interior levava algo rodeado de
flores.
Nestes momentos olhava
singelamente para o horizonte e pensava: “às vezes o mundo troca as voltas às pessoas”
ou então as “pessoas não sabem trocar as voltas ao mundo”.
Até os passarinhos olhavam para ela
e viam os seus olhos turvos e a fronte
enrugada com marcas profundas de sofrimento para pensarem ao mesmo tempo, que a continuar
assim, um dia a sua alma iria depenar lá para longe, para depois ficarem sem a companhia de quem já sabia e conhecia o
significado dos seus chilreares.
Às vezes temos as coisas na nossa
frente e não as vemos. São nestes momentos de descuido que a vida nos passa ao
lado. Se as vermos, então encontramos o nosso caminho que nos levará à busca da
razão de viver. É este o sublime momento de sabermos suportar a passagem da
tempestade.
Mariana
sabia que o «brilho» queria
dizer-lhe qualquer coisa.
Que quereria o
brilho dizer-lhe? “Que tormento me espera depois de viver constantemente no
meio da turbulência?” –perguntava a si própria.
“Oh! mortalidade, porque não me
buscas? Chamo-te para junto de mim e nunca ouves as minhas palavras. Deixa-me
ir para junto de ti. Lembra-te de mim!” eram as palavras
que costumava gritar quando a raiva explodia dentro do seu ser.
Despedaçada
interiormente pelo que era, sabia que o
seu futuro continuava ameaçado. Foi quando no silêncio do vale e no barulho do
silêncio, ouviu uma voz
dizendo-lhe “inicia o teu percurso
porque a noite é apenas uma parte do dia e acredita na tua fé porque estiveste
mergulhada tempo demais na escuridão. Ergue a tua cabeça e não desprezes a tua
personalidade. Sê tu mesmo! Nunca mais deixes de ouvir a tua voz interior e
conhece os sinais que a vida te vai dar,
para nunca mais dizeres que nunca os vistes”.
Com o que ouviu e com
a confiança que ganhou em si própria mergulhou na noite escura
atravessando a floresta que a separava da estrada.
Mariana soube construir um mundo muito especial para aqueles a quem a
vida nunca tinha sorrido. “O mundo
está sempre em mutação” dizia
Soube construir
estruturas para que aos mais desfavorecidos nada falte como soube ensinar as pessoas a
ajudarem-se a si mesmas. Mandou plantar campos floridos e campos de trigo para que nas noites de luar
pudesse ver na obra que fez e na
companhia dos que mais precisam, os sinais que costumam estar no brilho das
estrelas.
Sem comentários:
Enviar um comentário