António Centeio
Adalberto é um
patusco e amigo da galhofa. Garganeiro, por defeito, não deixa de ser boa
pessoa. Amigo de seu amigo está sempre pronto para a brincadeira. Leva os dias
vagueando, no bom sentido, pelas ruas e ruelas da cidade, falando com este ou
com aquele.
Pergunta a uns
como vai a agricultura, a outros como vai a família e aqueloutros como vai a
situação, porque segundo os seus conhecimentos, a coisa vai preta por causa da
crise que o mundo atravessa, ou que atravessamos por via das asneiras dos
outros. A haver baboseiras, será sempre dos outros e nunca de nós.
Excepção, nos
dias úteis, é o dia seguinte à segunda-feira. Dia de romaria e cavaqueira.
Levanta-se bem
cedo para assistir ao iniciar do dia a fim de poder ver a montagem dos
vendedores ambulantes no espaço a que alguns chamam de «Mercado
Semanal».
Os outros
afirmam que não «será por muito tempo» para acrescentarem os que nada sabem
«era o que faltava! Um terreno valioso como este, de tão bem estar situado –
tendo uma ocupação semanal pelos vendedores onde nem factura é exigível para
quem vende as mais diversas coisas, algumas, vindas de não se sabe donde – ser
utilizado para outras coisas ou encher a carteira a algum especulador».
Adalberto
percorre com a sua calma de alentejano todo o espaço, sempre de tronco erguido.
As mãos por detrás das costas, seguras uma na outra, não vá perder alguma ou
algum amigo do alheio tirar-lhe dos dedos ou do pulso aquilo que lhe foi
oferecido, como do que representa.
Ouve aqui e
acolá, para além ajuizar com velhos amigos o que antes ouviu. Assim pode ouvir
o botar palavra de terceiros como fazer o seu próprio juízo, que nos
dias que correm é preciso muito, se tomada em atenção for a idade da pessoa como
dos que se juntam.
Por volta da
metade do meio-dia, conforme as horas ou ponteiros, vai arrancando a caminho de
onde alguém o espera para lhe dar o merecido, mas obtido dos rendimentos
adquiridos em tempos passados por conta de outrém.
Aqui, nas poupanças
que uma entidade qualquer a que chamam de Estado, acrescidas de rendimento que
deveria ter obtido, é que os dias lhe parecem estar a ficar cinzentos demais,
porquanto ouviu de um sabichão que pelo andamento que a coisa leva, qualquer
dia nem para a sopa já chega.
Ralha como um
desalmado com tudo e todos que o rodeiam, dando a impressão que são os
culpados, mesmo que a sua velha Carminda, companheira que é para um ror de
anos, se compadeça sempre das malcriadices que vem da boca de quem tanto sabe.
Quando nas
noites de tertúlia livre, que obriga os vizinhos do bairro a conviver todos na
roda da mesa da sueca, falando os cujos do que todos falam, a noite passa a ser
agoirenta para ficar também sem estrelas porque o futuro está ameaçado por quem
manda poupar mas não rentabiliza, o que na sua posse está, ou não rentabilizou
em devido tempo, aquilo que deveria ser o sustento e segurança para quem
trabalhou, tornando a posteridade dos mais novos como um mergulho em águas
baixas do rio.
Destas
discussões, o resultado foi, segundo os pareceres do Adalberto, ficar sem
efeito a excursão, e as futuras, que estava marcada para o mês do ano com menos
dias, aconselhando a quem o ouvia, que «estas passeatas deixem de ter efeito
imediato para serem substituídas pelas Termas
do Cartaxo».
Mais do que
nunca, temos que começar a sermos forretas, já que no presente, até os bancos
já estão a dar um “chouriço a quem lhes der um porco”.
Como a carne até
já vem embalada ou «fechada hermeticamente» como consta nos rótulos nos espaços
comerciais maiores que o «Municipal» dificilmente haverá o enchido
que todos querem.
A conclusão, com lógica do amigo patusco e galhofeiro, é
que o futuro está a ficar preto demais para quem trabalhou e foi obrigado a dar
à entidade responsável o «guardar uma parte daquilo que não queria para que da
poupança um mealheiro tivesse nos dias do fim da vida».
Aos que argumentam o contrário, que se cuidem,
porque os saloios costumavam dizer no tempo que os excursionistas do Adalberto
e seus confrades iam – ali para os lados de Mafra mesmo que o motor da
camioneta fizesse o caminho todo a dar «ráteres» que mais pareciam
petardos de S. João – ver o convento, para depois no fim da viagem ou do dia,
acabar tudo nos comes e bebes: «Quando começares a ver as barbas do vizinho a
arder mete as tuas de molho».
Sem comentários:
Enviar um comentário