Por
ANTÓNIO
CENTEIO
Quando acordou já era dia e um lindo sol coloria tudo ao
seu redor. Para Sandra, o problema era com atravessar a floresta. O silêncio da
floresta intrigava-a como os perigos que existiam no seu interior. Mas sabia
que uma pessoa sábia tenta resolver os problemas antes que eles surjam.
Descobriu que a noite é apenas uma parte do dia. Foi então que iniciou o
percurso que tinha que fazer. Acreditava que algo a acompanhava nos seus
passos. Nunca se esquecia de todas as armas que o homem foi capaz de inventar,
a mais terrível – e a mais poderosa – era a palavra. Quem era e o que fazia
sabia, muito bem. Mas há coisas inevitáveis que temos que aceitá-las como são
ou então descobrir o segredo em como contorná-las para que não se avolumem
mais. Tinha uma enorme Fé. Ensinaram-lhe desde pequenina que precisamos de
confiança e, a confiança chama-se Fé. A fé é um mergulho numa noite escura.
Acabou por atravessar a pequena floresta que a separava do chamado mundo civilizado.
Desde pequenina a minha «aluna» demonstrou sempre que,
história ou filosofia seria o destino da sua licenciatura (como adorava as
estrelas e o seu encanto). Acabou por escolher a última. Dizia sempre que nos
mistérios do azul recebia as mensagens daquilo que acabou por seguir. Sandra
era um encanto. Rompia pelos pensamentos uma áurea de inteligência para no
brilho dos olhos resplandecer algo de misterioso. Toda ela era uma argúcia da
natureza (só eu, a sabia compreender). Bem cedo descobri nesta aluna que a
sua capacidade em acreditar nos sinais era algo fora do comum. Previa para ela
um grande futuro – nunca me enganei. Sinto-me feliz pelo tempo que despendi com
Sandra.
O nosso encontro acabou por ser sublime porque o encontro
de duas almas gémeas é maravilhoso. Sandra, sabia – mais do que ninguém,
compreender os sinais. Nos encontros que costumávamos ter no silêncio da cabana
com os nossos mensageiros acabavam sempre na aproximação de dois corpos
espirituais. A essência da beleza e da Alma do Mundo não nos deixava ir mais
além. Era o segredo de duas pessoas que buscavam a sabedoria no meios dos
sinais e das estrelas.
Muitas vezes com a sua cabeça apoiada nas minhas pernas
lamentava que a sua maior mágoa interior era saber que neste mundo materialista
as pessoas nem sempre entendem a nossa linguagem.
Como gostava de Sandra!
Nestes momentos éramos duas pessoas numa só. O outro mundo,
só compreendia palavras como ambição, riqueza e sucesso. Mal sabia que o futuro
lhe reservava uma grande surpresa. Nas tardes chuvosas e de trovoadas
assustadoras eu costumava ouvir o seu pequenino coração chorar. Chorava, porque
nas profundezas do seu ser era sensível. Sentia-se insignificante para acabar
com o sofrimento dos mais carenciados. A dor dos outros entrava nas suas
entranhas. Como compreendia o seu grande coração.
Sentia-se uma privilegiada por estar comigo e me ter
encontrado. Adorava-me e considerava-me um mestre. As suas primeiras palavras
foram que “o amor é uma ponte que permite passar do mundo visível para o
invisível”. Disse-me que estas palavras mais não eram do que uma homenagem a um
grande escritor brasileiro que com a sua pena e sabedoria lhe tinha tocado no
fundo do “ coração”.
Respondi-lhe que é preciso termos confiança na capacidade
que cada pessoa tem para se ensinar a si mesma.
Sandra encontrou o seu caminho. De tanto amar Yorhge – como
sabia e podia – só podia receber confiança e segurança. A vida é feita de
sonhos e ilusões. Passado pouco tempo casaram-se. Yorhge era um homem
experiente e um pouco mais velho do que ela. Mas soube recompensar Sandra com
paixão e amor.
A vida prega partidas. Yorhge era um homem ambicioso.
Correu riscos e seguiu certos caminhos que lhe dariam no futuro tanta amargura.
O sonho diluía-se. Sentia que o amor caminhava para o
abismo. A ganância de querer sempre mais e mais acabou com aquilo que sonhara.
Ainda bem que não tivera filhos.
O seu futuro estava ameaçado.
Nos meus ombros, as suas lágrimas corriam, sentindo eu, que
a amargura estava a entrar nas profundezas da sua alma. A minha alma sentia a
dor da minha aluna. Estava a sofrer em mim aquilo que Sandra sentia. Éramos
como duas almas gémeas, a dor de um, era a de outro
“Ajude-me a suportar aquilo que me consome” clamava! Como chorávamos
os dois.
Eu semeei os meus sonhos no chão que agora pisas; pisa
suavemente, porque estás a pisar os meus sonhos, disse-lhe.
Viajamos os dois para onde pudéssemos cheirar a maresia no
mar e o gosto do sal na boca. Foi então que os seus olhos brilhantes sentiram
um momento intenso. Atraída por outros olhos viu que as palavras de Francesco
Alberoni correspondiam à verdade. Vacilou um momento mas o homem que estava na
minha retaguarda era o amor da sua vida.
Vinda de Samora Correia encontrei-a em Lisboa nas
proximidades de um grande centro comercial. Contou-me que tinha três filhos e
viajava pelo mundo. “O mundo é como as estrelas, sempre em mutação” dizia-me
ela. Afinal tinha aprendido alguma coisa comigo.
Acreditava na presença daquilo que sempre acreditou. A todo
o momento pensava em
mim. Recordava com nostalgia as noites que passávamos na sua
casa.
Naquelas noites frias junto da lareira onde me pedia
docemente “senta-te no sofá, porque só nele, com a companhia do calor das
brasas, podes sentir o som das melodias que as cordas do meu violino tanto
sensibilizam o teu coração. Para ti mestre, que tanto adoro, dedico-te as
memórias do tempo”.
Como ela sabia executar “Lara’s Theme”. Tinha o “ dom” de
me sensibilizar. Sabia o sentir do meu coração e aproveitava todas as
oportunidades da vida para que estas demorassem muito tempo a voltar. Por tudo
que lhe ensinei e pelo que fiz por ela, com os olhos fixos em mim, as suas
lágrimas corriam pela sua face, cuja pele já demonstrava que o passar dos anos
deixam as suas marcas. Mas a sua beleza feminina interior continuava sendo a
mesma.
Mestre, como me chamava Sandra, dou-lhe como presente, ser
o mestre de Petrus – seu filho predilecto, pela sua gratidão e pelo facto de
existir como ter vindo ao meu encontro e ter esperado tanto tempo por ele.
Leve-me consigo –
disse ela. Ensine-me a caminhar pelo seu mundo. Viajámos os dois no tempo, no
espaço. Sandra viu campos floridos e cidades que flutuavam em nuvens de luz. No
campo de trigo, ela compreendeu que os símbolos sagrados estão num dos Pólos da
Terra. Precisamos de encontrar o nosso caminho mas sem nunca termos medo de o
atravessar.
Lembrar-me-ei de ti a vida inteira, e tu lembrar-te-ás de
mim, como das coisas que teremos sempre porque não podemos possui-las.
É preciso ajudar a construir, é preciso ensinar as pessoas
a ensinarem-se a si mesmas. É pena que não seja da tua idade. Teríamos sido um
grande casal. Não me esqueças nunca!