Por: António Centeio
Todos os meses
fazem a viagem habitual até Vila Velha de Ródão. O velho automóvel já está
habituado às subidas da serra. Nunca se queixa do esforço que lhe exigem como
do peso que leva, talvez por a estrada fazer
deslizar as rodas sem qualquer solavanco como nos tempos que saiu do “stand”.
Os ocupantes já
não passam sem a beleza estonteante da serra como da paisagem que cativa quem a
saiba apreciar. Depois: o cheiro que vem do interior da terra; o sossego da
zona que permite contemplar aquilo que «só do alto se pode ver»; o arvoredo que
confere a tranquilidade; a zona serrana que
permite um profundo envolvimento com o meio, possibilitando desfrutar paisagens
abertas, algumas majestosas em contraposição com espaços estreitos para
visualizar ao mesmo tempo a união entre o azul do céu, por vezes também a
neblina branca.
Disseram-lhes em
tempo, que nesta pacata vila se costuma vender «os melhores queijos do país»
feitos manualmente por mãos hábeis levando a que os seus produtores não
precisem de andar por tudo que seja sítio a vendê-los. A fama do que sabem
fazer permite-lhes apenas aguardar a chegada de quem de tão longe vem.
Argumenta, quem os faz, com uma pouco de
razão, que a publicidade dos seus clientes é suficiente para «não chegar para
as encomendas». Daqui aconselhar a quem não conheça o negócio que «nunca se
aventure a fazer qualquer tipo de viagem sem contactar» quem tão bom queijo faz
e vende, caso contrário, poderá chegar à localidade situada na encosta da serra
e não trazer os seus queijos.
Foi numa destas
viagens que o casal e respectivos acompanhantes ao aproximarem-se da “D’Ródão” viram à distância, estendida
na berma da estrada uma velha e comprida mala de viagem, daquelas de cartão.
Deduziram que a mesma tivesse caído de algum carro, daí, terem parado e
apanhando-a para a levarem para o “porta-bagagens”
do velho “Fiat” com o objectivo de
ser averiguado quem seria o dono ou….ser visto o seu conteúdo já que algo
indicava que vazia não estava.
Foi quando
alguém de lembrou «Vamos levá-la. Em casa será aberta e logo se verá o que tem
ou de quem é». Assim foi. Feita e armazenada a encomenda do mês, no
porta-bagagens que levou o queijeiro a espantar-se com tal relíquia, como a
dizer alguns piropos menos impróprios para a situação do achado, voltaram para
a cidade de onde tinham partido horas antes.
Mal estacionaram
a viatura na garagem, a fim de se descarregar as compras, como o achado, depois
de fechado o portão não fosse algum curioso pasmar-se com o que visse ou desse
com a «língua nos dentes» a mala foi colocada em cima de uma mesa. «Até parece
que achamos um tesouro» disse a dona da casa para se rirem numa forte
gargalhada.
No momento em
que meteram uma faca para rebentar as fechaduras da mala de cartão, de tão
ferrugentas se encontrarem, ouviu-se logo um estalido que indicava a abertura.
O incumbido de abrir o tesouro fez render a expectativa; o silêncio fez
barulho; olhos vindos da escuridão esperavam pela descoberta obrigando a que o
viajante mais novo gritasse «Deixe-se de lérias e abra é essa porra!». Ao mesmo
tempo ouviram, vindo do cimo, um forte estrondo – era a inquilina do andar
superior a partir no chão um tomate congelado.
Todos mudaram de
cor, exclamando em coro «a mala está assombrada». Recompostos do susto a mala
foi aberta. Apenas continha: duas velhas e sarnentas fotografias de aviões da “Segunda Grande Guerra”; três ou quatro
bocados de papelão, do tamanho de uma caixa de fósforos, que indicavam: ser o
escriba um forreta ou um qualquer “manga-de-alpaca”
já que neles constava os gastos feitos em “compras para casa no mês de
Julho” do longínquo ano de mil novecentos e cinquenta e dois.
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